13/01/10 – quarta-feira
“A cabana virou um parquinho…“, constatava ontem um desgostoso Rubens Espírito Santo olhando derredor. Referia-se, muito provavelmente, à atmosfera excessivamente permissiva tanto estética quanto moral em que mergulhara a galeria Mario Schenberg, tomada que estava por experimentações, ensaios, esboços, tentativas de obras que se deixavam acumular sem maior compromisso consigo mesmas.
A situação não duraria até hoje: antes das 7 da manhã, RES arrancou os ocupantes da cama para transformar um ensaio de cabana na cabana em si. Cataram tudo o que estava disperso e compactaram. Uma grande caixa da Tegam, que Bhagavan pintara com tinta automotiva e recheara com colagens evocando recordações anônimas , transformou-se em parede de um segundo andar sobreposto aos antigos dormitórios. O mesmo aconteceu com a prancha de madeira com uma fiação emaranhada alimentando uma dinamite de luz (cf. uma pintura extemporânea), com o armário da antiga biblioteca e com a pianola safari – tudo subiu e virou parede.
Outras coisas ainda subiram acima da retalhada edificação, como uma pintura toscamente estilizada de uma mulher nua em cruz e um pesado capô vermelho de automóvel, pendurado de modo instável sobre o vazio.
Duas aberturas fundamentais vazam o corpo do cortiço: uma, um rasgo na madeira sobre o qual foi posto, como um toldo, um capô cinza de automóvel em que a figura rudimentar de um homem está gravada com maçarico; outra, a antiga saída dos dormitórios, agora articulada a uma porta de geladeira general electric ferrada com dobradiça. Uma terceira saída, menos visível e útil, mas não menos importante esteticamente, consiste no espaço quadrilátero vazado deixado detrás da fiação dependurada da dinamite de luz, espécie de respiro análogo àquele da peça de cima (cf. uma pintura extemporânea), só que numa versão maior e mais real, como se aquela interpenetração ontológica tivesse saído da dimensão sugestiva para efetivamente ser.
O resultado – revolucionário resultado – foi uma cabana. Uma cabana de verdade, habitável, erguida no interior da galeria Mario Schenberg. O relaxado apê estudantil virou um cortiço arriscado que, para não desabar, precisa ser encarado com mais cuidado. Achtung, baby!
Em Tempo: Rafael Pajé Aboud sofreu uma perfuração no pé durante a empreitada, mas passa bem.
Alô alô cambio
Cabana …responda…cambio ….vocês estão construindo um útero compartilhado com a cidade ou será isso uma projeção minha? a arte está desconstruindo cada artista que está aí para deixar a poeira do passado ser varrida pelos desastres ambientais? Vocês não se denominam cabaneiros né, assim espero. É bacana a idéia e incrível a realização…não deu pra ver tudo neste blogue porque o fazer artístico é multiexternofacetável…externalizar multiplas falas e gestos e pensamentos…………respondam pra mim seus artistas cabaneiros e insistentes: A arte sustenta?
Minha solidariedade e admiração artística segue nestas linhas
Abracos,
Anastácia
PS:não deixem o bigbrother entrar aí.
Na literatura, “litterae non dant panem” [as letras não dão o pão] é uma expressão proverbial. Quanto às outras artes, parece que a coisa não difere muito. De qualquer forma, obrigado pela solidariedade e admiração.
muito bem, anastácia!
belo comentário!