Extensões subterrâneas

4/10/2010 – quinta-feira

           O dia de hoje foi agitado na cabana. Às 18h00, os trabalhadores que voltavam para casa pela estação Santa Cecília de metrô depararam-se com uma apresentação musical de Thiago Nassif (contrabaixo), Pedro Maia de Resende (picape eletrônica), Victor Sardenberg (guitarra), André Sztutman (sintetizador) e Fernanda Zerbini (vocal). A “banda extemporânea” assim formada subiu ao palco do projeto Encontros do metrô paulistano determinada a tocar de improviso.

          Deu no que deu, mas o fato é que o público de Santa Cecília não desmereceu aquele bando de desgarrados do cotidiano esforçando-se ao máximo para chegar não se sabe aonde. O toque libertário flower-power no meio do underground foi assumido por Fernanda Zerbini, que comprou numa floricultura das Clínicas duas enormes margaridas para enfeitar os pedestais de microfone. Fernanda, aliás, foi ótima: introvertida na música de seus instrumentistas, na qual se inseria como um elemento sonoro a mais, sem nenhuma ansiedade de se fazer ouvir, poupou também o público de qualquer performance provocativa ou teatral.

          Ao retornarem à Funarte, foi a vez de os músicos se depararem com uma aparição subterrânea: quatro membros do coletivo Beco da Arte – Gustavo Ferro (desenho), Leonardo Araújo (texto), Amilton Santos (pintura) e Jaime Laureano (vídeo) – visitavam o QG da cabana extemporânea, em companhia do artista plástico Rafael RG, no que concederam uma entrevista a este escrivão.

          O Beco da Arte é um coletivo de artistas que fizeram do porão de um vizinho um bunker de circulação alternativa de produção cultural. Além de realizarem ali suas próprias experimentações, os caras do beco promovem mostras com artistas de fora nas quais a função de curadoria passa para as mãos do público frequentador, ao qual é delegada a responsabilidade de eleger aqueles que irão ocupar o porão.

          Numa sucinta análise estética da produção que tem ocupado o Beco desde 2008 – ano da abertura do espaço do porão para alheios –, Amilton Santos comentou que as obras, de um modo geral, se destacam pela fragilidade material, afirmando que “os trabalhos passam uma impressão de não preocupação”, o que seria uma tônica da produção contemporânea.

          Quanto à função do artista na sociedade, a resposta mais sintética – e mais espontânea – foi dada por Rafael RG, que simplesmente respondeu: “Ser feliz”. Explicando esta afirmação comentou que “mal conseguimos salvar a nós mesmos, quanto mais aos outros”.

          A entrevista, embora breve, serviu para reforçar a hipótese de que os artistas da atual geração tem se preocupado cada vez menos com as obras materiais em si, inquietando-os muito mais a busca de “um modo de viver” encarado enquanto autêntica arte.

          Isto fica mais evidente se atentarmos para a poética do próprio Rafael RG (pelo menos tal como foi resumidamente exposta pelo jornal Folha de São Paulo na matéria 10 apostas para 2010):

          “Está em toda parte este paulista. Rafael RG, 23, se divide entre curadoria, o trabalho numa galeria e a produção de obras. Para isso, encarna um personagem, performance que é ao mesmo tempo vida real. ‘É só aparecer nos lugares’, resume. ‘Todos se preocupam em entrar no sistema, mas não em se manter.’”

          A elucidadora matéria do jornal, assinada por Silas Martí, diz expressamente que “No fim desta primeira década do século, surge uma geração híbrida de artistas. Estão todos preocupados em repensar suportes, assumindo mesmo o papel de inventor. Dentro do circuito, não se contentam com a posição do artista. Querem ser curadores e galeristas ao mesmo tempo. (…) Parece ressurgir também com novo fôlego a performance: artistas que fazem da própria vida um ato artístico.

          Onde irá parar essa arte? A que necessidade ela responde? De qualquer modo, aqui está Rafael RG: aparecendo também na cabana.

2 Respostas to “Extensões subterrâneas”


  1. 1 roberto 08/02/2010 às 11:40

    é muito simples analisar isso.
    Desenhar,Pintar, carregar isso como um veiculo de comunicação, desenvolver um trabalho solido, apresendar pras pessoas,..lidar com os desafios que o trabalho impõe.Construir uma linguagem propria..linguagem plastica/grafica,ter um trabalho é muito dificil hoje em dia. Então os pseudo artistas desencanam disso, jogam a toalha por falta de talento,coragem e dedicação, e se tornam faladores, repetem discursos de europeus. Artes Plasticas não é literatura e nunca vai ser. Quantos ai dessa cabana sabe desenhar? tem noções concretas de planos,volumes,ritmo de desenho,conseguem se expressar com o desenho? ou quantas telas produziram? sera que elas eram verdadeiras? tinham conteudo? ficam so pregando lixo, amontoando coisas, igual o rubens e falam que é artes plasticas.Pode ser, mais ta bom,..vamos virar a pagina.
    Teorias voces tem bastante, da pra perceber, todo mundo le bastante e tal, conhece os grandes pensadores europeus. Mais fazer Arte é outra coisa. Melhor a galera por ai dar uma acordada, descer uns degraus e recomeçar.
    Essa é minha opnião,desculpe se fui um pouco agresivo.

  2. 2 BOCÂINA 08/02/2010 às 16:52

    Ou Robertinho…
    Se num foi nem um pouco agressivo, aliais acho que de agressividade você entende muito pouco…Entende muito pouco pelo visto de muita coisa…Não precisa se desculpar, sua ignorância já me conforta.
    Primeiramente, essa pagina que você está virando, nesse textinho medíocre, Já foi virada pelos próprios integrantes do movimento cabana extemporânea. Quero dizer…Perceba que você está escrevendo…Logo está querendo nos dizer algo…Não está nos apresentando uma pintura, nem um trabalho gráfico, muito menos discutindo uma linguagem. Quer nos dizer algo com palavras, sobre como não devemos nos focar nas palavras e discussões?
    Uma pessoa que conhece o real significado da palavra LINGUAGEM jamais diria a seguinte frase:“Artes Plásticas não é literatura e nunca vai ser”
    Obrigado pelo conselho Roberto, enquanto nos precisamos acordar, você precisa dormir para ativar um pouco mais seu inconsciente.
    Outro detalhe…Começar um texto dizendo: “É muito simples analisar isso” compromete automaticamente todo conteúdo que se deseja discutir, só é muito simples se a analise ignorar muitas variáveis, se ela ignorar estas variáveis…é um discurso ignorante.
    Roberto corta essa! Escreve de verdade como você gostaria de ter escrito, agressivamente…
    Posso fazer um retrato seu em desenho, que jamais você teria pensado em ver, mas, por uma espécie de bom senso, eu não o mostraria para os espectadores sua figura comum dentro deste tempo.

    BOCÂINA


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