A Reação de RES

25/01/10 – segunda-feira

          Hoje, Rubens Espírito Santo teve acesso, em primeira mão (antes de qualquer outra pessoa afora este escrivão), ao conteúdo das postagens Dadaísmo Extemporâneo? (I e II), referentes aos dias de sexta e sábado passados. Talvez os leitores que acompanham ao vivo a atualização do diário da cabana na internet estranhem esta informação, já que o presente relato está sendo postado numa terça-feira, dia 26. Mas mais confusos certamente estão, neste momento, os leitores que leem o livro feito a partir deste diário, no futuro. Tudo isto para mostrar o significado de um atraso quando se escreve um livro em crônicas publicadas diariamente, seja na internet ou num folhetim do século XIX.

          Pois bem. O fato é que hoje (segunda-feira), RES leu o primeiro texto em que o escrivão, desviando-se temporariamente da sua função usual de relator da ocupação, produziu exclusivamente uma crítica da produção da cabana, onde realizou, por meio de uma propositada comparação indireta entre RES e Tristan Tzara – mentor intelectual do mais radical movimento de vanguarda artística do século passado –, um questionamento sobre se o conjunto da obra da cabana poderia ser rotulado, genericamente, de “dadaísmo extemporâneo”, produzindo assim uma espécie de “afirmação interrogativa” consciente das incômodas suspeitas que levantava.

          Ora, o próprio escrivão, mais do que ninguém, tem ciência de que “a crítica que, para não ter o trabalho de meditar e aprofundar, se limitasse a uma proscrição em massa, generalizando, seria a crítica da destruição e do aniquilamento“(cf. Lições de um fiasco) – uma crítica ela mesma dadaísta, por assim dizer. Do mesmo modo, sabe por experiência própria que aqui, dentro da cabana, acontecem coisas que vão além da poética de “terrorismo cultural” de Tzara. Portanto, a insistência do escrivão em etiquetar a obra de RES de dadaísmo extemporâneo teve, sim, a função de provocar uma discussão, julgada pertinente (e urgente) porque adianta a visão de um beco inevitável que se aproxima na trajetória ora tomada de construção de uma poética própria, beco do qual se há de forçar uma saída. Igualmente, põe-se à prova a crítica mesma, posto que os princípios que a dirigem (cf. Lições de um fiasco) implicam expor a própria hipótese levantada à contraprova, senão a crítica não passaria de um julgamento predeterminado à distância – procedimento inaceitável quando crítico e artista estão obrigados a conviver numa mesma obra (coisa que só uma experiência como a da cabana extemporânea pode propiciar).

           Bom, RES não gostou nada desta estória de ter sua poética rotulada de dadaísta (e quem, aliás, gostaria de ser enquadrado, encarcerado determinantemente numa gaveta do cérebro de outrem?). “Se isto aqui fosse Duchamp, eu queimaria tudo e iria embora”, afirmou taxativamente. Participaram desta conversa, ocorrida dentro da galeria Mario Schenberg sem luz (devido à queda de energia decorrente de mais uma tempestade a assolar São Paulo), André Sztutman e Rafael Pajé Aboud, aos quais foram se juntando, aos poucos, os visitantes inesperados Mônica Oliva, seu filho Chico Oliva, Maura Grimaldi, Daniel Pirolli e – para grande alegria dos cabaneiros – um surpreendente Lucas Rehnman, que afinal volta à atividade depois de curta (mas sentida como longa) ausência. Ninguém se incomodou com a falta de luz, pelo contrário: Mônica Oliva expressou o sentimento geral ao dizer que o ambiente estava “mais uterino”.

         Primeiro, RES comentou que, se fosse para compará-lo com algum artista, que fosse pelo menos com alguém como Kurt Schwitterz, Anish Kapur (não formalmente, mas poeticamente) e – especialmente – Joseph Beuys, que estão à frente (inclusive no tempo) de Tzara e Duchamp, e mais próximos dele. Que, ao comparar sua obra com o dadaísmo primário de Duchamp e Tzara, o escrivão demonstrava sua própria defasagem teórica, dando um tiro no pé: “Se você der mais um tiro desses no pé, daqui a pouco não vai mais poder andar”, advertiu.

          Depois propôs à roda a seguinte questão: o que faz da cabana extemporânea uma obra diferente de todas as demais?

          André Sztutman, com as habituais reticências, atentou para o fato de que a cabana é um lugar de exposição pessoal.

          RES então interpelou seu aluno para que fosse mais direto, mais incisivo, mais estúpido se necessário.

           “Aqui é um lugar onde as pessoas põem o cu delas na reta”, retocou Sztutman com incomum pontualidade.

            A isto RES corroborou com a idéia de que “o artista precisa estar desprotegido”, surgida numa conversa sua com uma interlocutora de cujo nome este escrivão não recorda no momento.

            Maura Grimaldi afirmou que “o legal é ficar todo mundo nu”.

           Lucas Rehnman reafirmou a natureza da cabana enquanto lugar de embate, de “colocar a pessoa à prova”, de superação.

          Rafael Pajé Aboud citou a espontaneidade misteriosa e imprevisível com que esses embates ocorrem.

           Mônica Oliva, com sua experiência, advertiu que a cabana só tem força enquanto seu principal trunfo – o debate franco – tem como foco o interesse verdadeiro em crescimento e aprendizagem, sem o quê os supostos embates recaem numa “conversa de comadre”, reduzidos a “briguinhas de egos” preocupados com suas vaidades.

           Chico Oliva, seu filho, colocou a cabana como “alvo de generosidade”, a qual nunca seria gratuita, mas conforme a complementaridade das necessidades e ofertas interpessoais.

            Quando o escrivão aproveitou a deixa de Chico Oliva para perguntar a RES qual era, na sua opinião, a real natureza (humana, sobrenatural etc.) deste intrigante processo que faz da cabana um pólo de atração de pessoas em sintonia de idéias e aspirações ou, ainda, com a mesma abertura a certo tipo de experiência transformadora, RES preferiu adiar a resposta.

           No entanto, citou ele próprio alguns elementos que, na sua opinião, tornavam a cabana uma obra única: o fato de a imaterialidade prevalecer sobre a materialidade (importando muito mais a ação do que o objeto), o fato de o cognitivo prevalecer sobre o formal (prevalecendo o modo do conhecimento sobre a configuração daquilo que é conhecido) e, principalmente, o fator pedagógico desta escultura social, na qual o importante não é a escultura dos objetos, mas a do próprio interior das pessoas e de suas relações.

           Nisto se vê que a poética de Rubens Espírito Santo, ainda que se servindo largamente do discurso, das técnicas e da liberdade formal conquistada pelos dadaístas, não se reduz ao Dadá.

3 Respostas to “A Reação de RES”


  1. 2 diariodacabana 26/01/2010 às 19:37

    falacho é isto:

    Nikolaus Günter Karl Nakszynski, mais conhecido como Klaus Kinski, (18 de Outubro de 1926, Sopot, Cidade Livre de Danzig – 23 de Novembro de 1991, Lagunitas, Califórnia) foi um ator alemão e pai da actriz Nastassja Kinski.

  2. 3 macadden 28/01/2010 às 0:11

    pelo visto res não entendeu ou fingiu que não entendeu o traçado paralelo dadaistico proposto pelo relator,e aproveitando a deixa que fingi ter agora pois não a tive,nosso amigo res deveria:

    alternativa A:liderado apenas uma viagem entre amigos pseudo artistas para o litoral norte(e não uma frustrada tentativa de liderar pseudo artistas na cabana extemporanea)

    alternativa B:ter nascido na época e participado da produção do primeiro disco da grande banda de rock progressivo bring to light

    alternativa D:e ai esta a arte,na surpresa,e na conjunção não obstante do traquionismo cultural da casa do caralhoista aquatico


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