BOLSONOIA: o conservadorismo adoentado e a insuficiência das ideologias em geral

 

 

 

André Luiz F. Torres

Algumas reflexões em torno destas eleições críticas de 2018, começando à direita:

Conservadorismo é legítimo, autoritarismo não.

Pelo menos não na democracia.

Ora, Bolsonaro defende terrorismo de estado e não reconhece legitimidade de votação que não lhe for favorável, está portanto fora do campo democrático e não deveria sequer ser considerado opção.

Mas está aí, lamentavelmente, como suposto representante do conservadorismo.

Péssima representação política. A adesão de conservadores comuns a um político autoritário de extrema-direita (isto é, contrarrevolucionário radical) reforça a pior caricatura do conservadorismo atual, de regressão a um anticomunismo enfermo, paranoico, fechado em sua bolha ideológica intoxicada que vai deturpando sua representação de mundo: a bolsonoia.

Vê-se daí como qualquer ideologia abstrata, seja socialismo ou liberalismo ou mesmo o aparentemente seguro conservadorismo, não é absolutamente certa por si, estando antes submetida às deformações particulares das pessoas e situações concretas, e às contradições de suas ideias com a realidade histórica e social específica. As ideologias são todas furadas, isto é, furáveis; o conservador Winston Churchill ficaria possivelmente muito contrariado de compartilhar o mesmo rótulo que Jair Bolsonaro. E o conservadorismo cultural, hoje em alta como reação aos excessos do progressismo, antes andou em baixa por seus próprios excessos.

Quanto ao PT, é de fato um partido de esquerda, mas não de extrema-esquerda – como por exemplo o revolucionário radical PCO. A ideologia do PT seria teoricamente uma espécie de socialismo democrático, na prática um trabalhismo de base sindical, que no poder tendeu para o lulismo, o qual pode ser entendido resumidamente como um pragmatismo político de conciliação nacional à centro-esquerda em torno da figura carismática de Lula, conciliação explicitada formalmente na aliança partidária PT (esquerda)- PMDB (centro), ou Lula-Sarney.

O lulismo teve sucesso prático e promoveu extraordinário progresso econômico e social, elevando o prestígio internacional do Brasil e alçando Lula a líder mundial. O Brasil ficou na moda e foi escolhido sede de Copa do Mundo e Olimpíadas. O pragmatismo lulista, porém, degenerou em governabilidade corrupta na propinocracia nacional, que envolve cartéis de grandes empresários e seus contatos com dirigentes apadrinhados em empresas públicas e com partidos políticos apadrinhadores, no caso da Petrobras incluindo o PT e partidos da base aliada no Congresso, como PMDB, PTB e destacadamente o PP (de Bolsonaro… embora ele não tenha sido pessoalmente citado).  Mesmo os partidos de oposição temporariamente sem apadrinhados em estatais, como o PSDB na época dos governos Lula, recebiam volumosas doações das empreiteras. Mas o envolvimento no mensalão e petrolão do PT, partido autenticamente popular e algo “socialista” (ainda que democrático), contribuiu para a sensação (particularmente da classe média) de esculhambação política generalizada agravada pelo viés ideológico. Maior ameaça, desse ponto de vista, a corrupção ligada a uma ideologia que o simples enriquecimento pessoal ilícito.

Entretanto, e aqui vem um grande complicador, os inimigos do PT aproveitaram-se desse clima para forçar de modo inconsequente a derrubada do governo petista num impeachment farsesco contra Dilma, sem levar em conta o esgarçamento democrático de uma derrubada de governo sem base jurídica clara e sem consenso social. Do mesmo modo, o presidente Lula foi condenado imprudentemente, na prática, por um apartamento que, se era pra ele, não chegou a receber. Mais apropriado seria os juízes do TRF-4 terem-no absolvido pela insuficiência de provas, e assim não colocar o país em situação complicada por condenar sua maior liderança política num processo questionável. Fora que o aclamado Moro já se revelara parcial quando direcionou os eventos políticos nacionais na condução coercitiva ilegal do ex-presidente e, junto com a Globo,  na publicização – com ares afetados de escândalo – de conversas pessoais que envolviam a presidente da República, num infame Jornal Nacional que determinou a queda final do governo.

Daí a encalacrada em que se meteu o Brasil, onde os que acham que estão muito certos também agem erradamente, levando o país a mais crises.

A situação atual de cegueira unilateral pela polarização radicalizada (especialmente por parte da extrema-direita, note-se, que enfrenta esquerda, e não extrema-esquerda), poderia ter sido melhor contornada (ou não…) com uma terceira via, como o PDT de Ciro, que ocupou o lugar na centro-esquerda deixado pelo PSDB de Alckmin, que se deslocou para a centro-direita.

Em qualquer caso, quer ganhe, quer perca o líder extremista de direita, o país terá muitos problemas com um político inepto e saudoso da ditadura alçado indevidamente à categoria de mito por neoconservadores fanatizados radicais, passíveis de transitar para o fascismo (imposição de contrarrevolução através de milícias). Mas esses são minoria. A resistência, por outro lado, é grande – e infelizmente também pode se radicalizar.

As últimas declarações de Bolsonaro, em discurso para manifestantes na Avenida Paulista, foram péssimas para o ambiente político. Indignas de um candidato a governar para todos os brasileiros. O importante seria baixar a radicalização, e não instigá-la. Oxalá prevaleça a democracia.

 

 

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