Diretor Nacional da FUNARTE visita cabana (cont.)

16/01/10 – sábado

            Ontem, antes de desfrutar do buffet oferecido no Centro de Convivência Waly Salomão, Ricardo Resende adentrou a Galeria Mario Schenberg, onde está instalado o QG da cabana extemporânea. Acompanhava-o Paula Amaral, cujo nome, junto com o do Sr. Roberto Marti (presente ao evento de confraternização promovido pela coordenadora Esther Góes), consta nos agradecimentos devidos pela FUNARTE aos realizadores do projeto ENTORNO DE / NOS LIMITES DA ARTE 2ª EDIÇÃO.

            Dentro da galeria, cada um puxou uma cadeira e uma roda formou-se. O próprio Ricardo Resende, usando de linguagem simples e espontânea, foi quem quebrou o gelo da reunião, facilitando o diálogo e diminuindo qualquer apreensão que a presença do Diretor Nacional pudesse causar nos artistas participantes do projeto que, afinal, é dirigido por ele. Assim, ainda que a alta posição ocupada e o desnível institucional em relação aos interlocutores justificasse algum rococó de formalidade ou ar de superioridade, Ricardo Resende mostrou-se livre de qualquer dessas afetações, das quais não demonstrou esforço para se desvencilhar, parecendo-lhe natural o ser simples e transparente.

             Sem embargo, foi direto ao assunto: traziam-no ao interior da galeria Mario Schenberg duas questões, a primeira relativa a uma demanda de terceiros que, em um e-mail de cinco páginas enviado à diretoria, haviam acusado formalmente Rubens Espírito Santo de exercer poder discricionário em espaço público. O segundo tema, mais ameno, referia-se ao andamento da relação instituição-ocupação (FUNARTE-SP/cabana extemporânea).

            Rubens Espírito Santo propôs que se debatesse logo a pendenga burocrática, iniciando sua fala. O episódio gerador desta demanda foi o entrevero ocorrido dia 16/12/09 (cf. O dever), em que dois palestrantes convidados pelo ocupante Lucas Rehnman deixaram a galeria Mario Schenberg após terem seu discurso desqualificado por Rubens quanto à forma. Dentre os diversos pontos feridos, Rubens ressaltou que, naquela ocasião, limitou-se a manifestar sua opinião pessoal em relação à fala dos palestrantes, cuja forma maçante desmerecia o próprio conteúdo de idéias apresentado; melindrados por terem seu discurso taxado veementemente de “chato”, os palestrantes deixaram a galeria, e agora faziam do caso uma tempestade, quando não passa na realidade de um copo d’água. Ademais, evadiram a galeria de livre e espontânea vontade, assim como entraram, em momento algum tendo seu trânsito impedido em qualquer dos sentidos.

            Ricardo Resende passou então ao levantamento de informações quanto à relação instituição-ocupação. Para isto pediu a opinião individualizada dos participantes.

            Lucas Schlosinski, por meio de sua experiência pessoal na cabana, atestou a coerência do modo de relação interpessoal sui generis de Rubens, tendo seu testemunho peso diferenciado em vista do dramático episódio em que se envolveu dia 04/01/10 (cf. O CORPO é quente como o SANGUE).      

            Jan Nehring apontou, com exemplos concretos, a ótima relação prática entre o corpo de ocupantes e o corpo de funcionários, desde a equipe de limpeza, a de manutenção e a de segurança até a administrativa, no que recordou os cafés de confraternização preparados regularmente por Silvia Mharques, sempre em clima de harmonia.

            Piero Chiaretti, embora não participe oficialmente da ocupação, testemunhou, como assíduo visitante (praticamente integrado ao grupo), que essa relação funcionários-ocupantes sequer chega a ser “institucional”, realizando-se mesmo no nível da pessoa humana, de modo natural.    

            Assim foram testemunhando todos os demais, sempre corroborando a idéia de que esta experiência de ocupação da instituição pública tem favorecido o crescimento humano principalmente dos artistas, mas também, em segundo plano, dos funcionários, que vão criando intimidade com o fazer artístico (não por acaso, Chicão, membro da equipe de manutenção, está expondo uma grande tela no bar do Bahia [cf. Extensões Extemporâneas], e Wenderson, balconista da lanchonete do Centro de Convivência Waly Salomão, participa com um desenho na miniexposição instalada no interior da cabana concreta erguida no interior da galeria Mario Schenberg).

            Quando chamado a falar, este escrivão destacou a iniciativa acertada de Ricardo Resende em possibilitar que a FUNARTE/SP abrigue 24h por dia os integrantes da cabana extemporânea, assumindo o risco de transformar uma galeria de arte oficial num espaço com vida própria, imprevisível, potencialmente conflituoso, no qual a interação entre os agentes de dentro e de fora da instituição está exposta à contrariedade e ao estranhamento recíproco, mas que, por esses mesmos motivos, torna-se um espaço potente, sanguíneo, vital. Neste sentido, o episódio do apagamento dos grafittis esteticamente comportados que havia no corredor de entrada do prédio, cobertos com rolos de tinta branca por RES  e recobertos com pichações e despropósitos, foi lembrado como um marco decisivo no esforço de tirar certa roupagem estática e inofensiva da FUNARTE/SP, recolocando a instituição em condição de assumir um papel social mais dinâmico e incisivo no desenvolvimento da arte.

          Ninguém, entretanto, seria ingênuo a ponto de pensar que este não seja um risco calculado; um funcionário público do gabarito de Ricardo Resende certamente mediu a tensão conveniente a uma máxima potencialização do papel de agitação cultural da instituição que dirige, até o limite possível para que a coisa não descambe para o vandalismo. O mesmo no caso da tensão estabelecida de antemão entre as três exposições concomitantes – e radicalmente opostas – que Resende colocou para coabitarem na FUNARTE/SP: a cabana extemporânea, com sua maioria de universitários expressando uma estética do precário e do transitório, de frente para os mestres da obra, com operários da construção civil fazendo obras com rigor formal e até certo academicismo vanguardista, e o Café Vacance de Laura Huzak, com seu irônico excesso pop provocando a ambos, como se a pequena-burguesia e o proletariado se encontrassem na grande corrente mediocrizante da cultura de massa.

         Enfim, tendo feito na cabana, com muito trato e especial carisma, a sondagem do que queria, Ricardo Resende cumpriu o restante de seus compromissos sociais e deixou a FUNARTE.

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