Arquivo para julho \15\-02:00 2020

Especial Saídas da Crise

Um argentino em quarentena

Antes da pandemia chegar à América do Sul, o argentino Sergio Hernandez Falcon, 43 anos, solteiro, natural de La Plata, mas vivendo bem mais ao sul em Comodoro Rivadavia, maior cidade de Chubut, província integrante da vasta e gelada Patagônia, trabalhava como mascate (vendedor itinerante autônomo) nessa cidade litorânea e em outras mais pequenas e afastadas da região. Comprava variedades ao norte nos atacados populares de Buenos Aires – piercings, cabos USB, fones de ouvido, carregadores, artigos de costura, baralhos e outras bugigangas – e revendia ao sul para pequenos comerciantes na Patagônia.

Numa mudança de ares completa, e necessária, fez no início de 2020 uma viagem tropical à Jamaica que durou um mês, de 1º de fevereiro a 5 de março. Se deu bem: conheceu uma jamaicana com quem namorou durante a viagem, e continuou mantendo contato por telefone.

Mal chegou em casa em Comodoro, e uma semana depois a Argentina entrou de quarentena rígida.

No primeiro mês ficou em casa, saindo só para comprar comida, exceto uma única vez em que visitou um cliente e fez uma pequena venda. De resto, isolamento contínuo. O contato pela internet com a jamaicana – também em quarentema em seu país, embora menos estrita, porque lá a pandemia atacou pouco – ajudou-o a enfrentar o período.

O governo argentino disponibilizou uma renda de 10.000 pesos (cerca de 650 reais) mas a cada um mês e meio. Contudo, o mascate contou muito mais com suas próprias economias.

Para falar a verdade, Sergio Falcon, que volta e meia pensa em filmes para fazer como cineasta, achou no começo uma maravilhosa experiência, o mundo inteiro em casa. Algo, de fato, extraordinário. Sobretudo em relação ao tempo, como uma parada reflexiva mundial.

Aproveitou para fazer muitas daquelas coisas que se quer fazer e se não tem tempo na rotina comum. Limpeza e ordem em casa, por exemplo, que quase nunca tinha. Voltou com mais afinco para o estudo do inglês, cuja necessidade notou na Jamaica. Assistiu filmes. E começou um novo projeto, de aprender a costurar com máquina, ideia que obtivera de um amigo de Santos (SP) numa viagem ao Brasil, Pedro Pablo, que tinha desenvolvido uma marca própria caseira de roupas íntimas, vendidas no atacado para pequenos comerciantes a preços mais baratos que a média de mercado.

Pelo terceiro mês da quarentena, começou a sair de volta à rua para algumas vendas. O trabalho regular, entretanto, passou a ficar difícil, não tanto pela dificuldade de venda, mas de compra: os produtos ficaram mais escassos e as encomendas mais complicadas.

Atualmente, embora ganhando menos do que antes da pandemia, está animado com a abertura em breve de nova opção de vendas, de artigos de costura, para o quê vem se dedicando diariamente em casa a aumentar sua habilidade com a máquina de costura nova.

Em entrevista, Falcon ressaltou que tem consciência de que para ele é mais fácil enfrentar esse período assim, solteiro e sem filhos, portanto sem muito compromisso e responsabilidade, e que sabe que a quarentena tem sido muito dura de um modo geral, econômica e emocionalmente, no que fez menção especial a idosos e crianças que estão longe dos amigos.

Quanto à própria subsistência, embora dificultada pela queda econômica geral, pode dizer que está razoavelmente tranquilo, até com perspectivas boas. Com o pé no chão, sem deixar de sonhar.


Estatísticas

  • 29.278 acessos
Follow DCAL – Diário da Cabana: Abrigo Literário on WordPress.com

Todas as Postagens

CLIQUE PARA VER A IMAGEM INTEIRA

CLIQUE PARA VER A IMAGEM INTEIRA

Entre seu endereço de email para seguir este blog e receber notificações de novas postagens

Junte-se a 8 outros assinantes